
Quando  eu fazia o curso de graduação alguns estudantes inventaram um modo  próprio de avaliarmos as aulas de que participávamos. O tom espirituoso  do “instrumento de avaliação” dizia-nos que, durante o nosso curso,  depararíamos com aulas “verdes, azuis e marrons”.
As chamadas “aulas verdes” funcionavam como um bom passaporte para o trato de informações objetivas que nos levava ao conhecimento subjetivo.
As chamadas “aulas verdes” funcionavam como um bom passaporte para o trato de informações objetivas que nos levava ao conhecimento subjetivo.
Todos nós as entendíamos. Porém, o potencial  formativo desse tipo de aula era tal que fazia mais por nós, uma vez que  nos possibilitava transformar o conhecimento apreendido em nossa  subjetividade em saber qualificador da intersubjetividade. O que antes  era pura informação no suporte material transformava-se em conhecimento  no nosso mundo interno, na nossa mente, para, em seguida (ou  concomitantemente), ser mobilizado em nossa ação no mundo, de maneira a  ser aplicado significativamente nos processos que desenvolvíamos na vida  pessoal, profissional e social. 
Aulas verdes produziam saber, e isso era tudo o que  alguns de nós mais desejávamos.Aquelas que chamávamos “aulas azuis”  dificultavam sobremaneira a nossa vida. Só o professor (ou professora)  entendia essa modalidade de aula. Nós, os alunos, ficávamos a “ver  navios”. 
Tínhamos mesmo a sensação de que não era apenas a  aula que se fazia inalcançável pela nossa compreensão, mas a disciplina  da qual ela era parte também fugia (com sua estrutura e sentido) das  possibilidades transmissivas do professor. A aula era truncada em sua  estrutura interna porque não se articulava, logicamente falando, com os  demais elementos que compunham a disciplina. 
A disciplina, por sua  vez, também não manifestava clareza quanto à sua razão de ser no curso  em que era desenvolvida. Resultado: todo o projeto político-pedagógico  formativo ficava a desejar na parte relacionada às tais aulas azuis. O  professor não entendia que o ato de fazer com que superássemos nosso  “não saber” constituía no seu desafio elementar em sala de aula, razão  pela qual a disciplina dele não passava de uma obriga toriedade sem  sentido. Só para ele a aula dizia alguma coisa. Quanto a nós, ela apenas  nos conformava em nossa ignorância, em nosso “não saber”.
Finalmente, tínhamos as  “aulas marrons”, as quais, além de carregar tudo o que “qualificava” as  “aulas azuis”, faziam-se muito mais complicadas: nem o professor nem os  alunos entendíamos a mensagem daquelas aulas. Calamidade total! O  professor não tinha claro para si que o magistério de nossos dias  requer, além de domínio teórico, metodológico e ético, a capacidade  comunicacional elementar para que a transposição didática se efetivasse a  contento. O fracasso na comunicação colocava em risco a relação  pedagógica, essa que se justifica quando o “ignorar” de alguns é  colocado ante o domínio disciplinar e epistêmico de um professor, de uma  professora. Essas aulas faziam-nos perder tempo, um bem realmente  precioso para quem cursa a educação formal.
Hoje, quando alguns de nós nos encontramos nas  “esquinas da vida”, ainda comentamos sobre aquele nosso modo de avaliar  as aulas de nosso curso. Noto em todos o desejo de que nossa educação só  irá realmente “entrar nos eixos” quando o verde da esperança, da  educabilidade e do entendimento compartilhado ousar adentrar nossas  escolas. Oxalá, esse acontecimento não demore e possa ser verificado por  todos quantos fazemos e sofremos a educação escolar. Em se tratando de  aula, podemos arriscar a dizer que “sem comunicação não há educação”. O  valor de uma aula reside em seu grau de compreensibilidade.
Wilson Correia é filósofo, psicopedagogo e doutor  em Educação pela Unicamp e Adjunto em Filosofia da Educação na  Universidade Federal do Tocantins. É autor de ‘TCC não é um  bicho-de-sete-cabeças’. Rio de Janeiro: Ciência Moderna: 2009. 
Um comentário:
Ótima postagem!
Abraços
Postar um comentário